Me dei conta, mais uma vez, de como somos diferente apesar de termos tido um passado comum e mais ou menos parecido...
Eu não sinto falta do meu passado, nunca senti nem qd saí de casa aos 18 anos… era como se não houvesse nada atrás que me seduzisse… a única coisa que me fazia falta era minha mãe, as coisas que fiz antes, mesmo qd pra me divertir com a família, ou amigos, eu sentia que não me completavam, falta-me algo... faltava-me EU!
Aos 14 anos qd entrei para um grupo de teatro, parecia que um mundo novo se descortinava a minha frente, foi o meu primeiro contato com gays assumidos, orgulhosos...pela primeira vez me dei conta de que eu não estava só, e um vazio até então sempre presente começava a ser preenchido por histórias, por momentos... por pessoas que finalmente tinham algo a ver comigo...
Para mim era difícil aceitar que a vida que a minha família programou pra mim não me atraia em nada... contudo resolvi mergulhar de cabeça nas coisas que me faziam feliz, e contra as determinações dos meus pais comecei a estudar ballet... daí por diante minha vida ganhou um sentido muito forte a minha existência sempre em crise encontrava paz nos passos da dança, no esforço físico e mental por querer algo maior...
Qd saí de casa pela primeira vez aos 18anos, com bolsa de estudos em um importante centro de danças de Salvador eu não imaginava que fosse tão difícil ficar longe de casa… pois pra fazer melhor aquilo que me propus eu teria de me afastar deles, pq na minha cidade o campo era muito limitado… A minha aventura começou qd aceitei este fato…de Salvador para o Rio de Janeiro, que foi o maior choque cultural pelo qual passei na minha vida, por conta do estilo de pensar, de ser e de viver dos cariocas...
As minhas raizes pareciam não estar tão presas ao chão de onde eu vim… anos a fio vivendo no Rio marcaram a minha vida por grandes transformações.
Na cidade maravilhosa eu pude experimentar tudo que a liberdade de viver sozinha podia me proporcionar, um deles e tão decisvo, o mais significativo, que mais tarde iria ser a maior revelação da minha vida...a minha sexualidade!
É por isso que me senti incomodada qd meu namorado falou sobre as coisas que lhe faziam falta, pq nada daquilo me atraia … talvez no fundo que desejasse ser como ele e gostar das coisas que todo rapaz gosta, ou talvez tb tenha pensado que da mesma forma que isso me afastou da família, as suas saudades também poderiam afastar-me dele por ocasão do nosso retorno ao Brasil, ja que nada daquilo me interessava. Hoje eu me dei conta de que não sei ao certo se tudo que eu fiz me realizou...ou o quê ainda me falta(?)...
Eu não consigo sentir falta da época que vivia com a minha família, qd sinto saudade é da minha vida no Rio de Janeiro... dos amigos verdadeiros que fiz, da minha casa de Copacabana, dos tempos de faculdade, das temporadas de ballet do Teatro Municipal, os domingos na praia jogando conversa fora com amigos naquela paisagem de Ipanema, nas sessões de cinema na Lauro Alvin, dos festivais de cinema( a amostra de cinema gay)...e toda coisas pelas quais eu ansiei tanto ver qd ainda morava com a minha mãe...todo o tempo em família me sentia pressionada a ser alguém que eu jamais conseguiria ser... talvez no fundo eu até quisesse ser…mas não conseguia...a tentação em descobrir o que em mim fazia ser a “ovelha negra” foi maior.
Eu vivia um grande crise existencial por não ter boas oportunidades dentro do campo da arte, tudo que que eu sempre sonhei já não me dava mais esperanças... passava por relacionamentos afetivos fracassados... o afastamento do meu grande amigo de adolescência(uma das maiores dores da minha vida)…o meu breve contato com uma droga sintética(ecstasy) que me tirou da uma depressão pra me jogar numa mais profunda ainda(foi o justo motivo para nunca mais querer saber disso). Nessa época eu desenvolvi Síndrome do Pânico… uma fase conturbada marcada por episódeos que naquela época não me faziam o menor sentido para mais tarde fazer TODO sentido... tive que decifrar aquele momento para enteder pa tudo aquilo estava me acontecendo...foi o mal que me fez o maior bem... eu resolvi dar a maior reviravolta da minha vida, EU DEI A VOLTA POR CIMA…Anos e anos dedicados a arte, que me pareceram ser em vão… mas não… eles me deram os melhores amigos, os momentos mais emocionantes e a cultura que adiquiri…
Na vida podemos nos identificar com muitas coisas…seguir outros caminhos, ter “planos B”... e foi justamente isso que eu descobri, eu me redescobri...eu também entendi que só fracassamos qd acreditamos nisso!
Já que meu sonho teve que ir para prateleira eu resolvi ser prática e ir em busca da minha independência financeira de uma outra forma, mas tendo como certo algo que considerava muito importante: jamais esquecer de tudo que eu fui até então, preservar minhas raízes pra não me perder nunca mais delas…contudo resolvi me me aproximar ao máximo da minha família e de tudo que aprendi junto a eles... e entender que mesmo tendo escolhido outros caminhos eu não era tão diferente deles o quão eu imaginava, pq no fundo eu era tão simples e tão comum como eles, que a minha sexualidade não me tornava diferente de ninguém... pq todos tem seus próprios sonhos e prazeres pessoais.
O fato de ser transexual e viver tal qual iria mudar demais a minha vida, mas jamais o meu coração.
O que estou tentando dizer é que para deixar desabrochar o meu coração e transformá-lo em vida, eu tive que, por algum tempo, matar meus pais dentro de mim, embora sem nunca deixar de amá-los...tive que me sentir completamente perdida, para então finalmente me encontrar. Agora, de posse de mim mesma, resgato, com toda segurança para mim, tudo aquilo de bom que me ensinaram, sem me deixar confundir entre a sua imaginação sobre quem eu sou, e as minhas próprias conclusões sobre mim...
Junto aos gays eu encontrei melhor identificação, embora não fosse homossexual, e sim transexual, meus amigos gays souberam melhor me compreender e me aceitar justamente numa época em que eu não precisava de críticas ou pressões... gays e transexuais estão unidos pela natureza de sua sexualidade...precisamos nos descobrir sozinhos, pq nascemos num ambiente heterossexual e para o bem da nossa auto-estima temos de buscar meios para nos encontramos sem nos perdemos de nós mesmos, nem de nossas raízes familiares, é um desafio não nos deixar olhar com os olhos de um mundo preconceituoso e repressor às diferenças.
Eu precisei ter muita confiança em mim mesma e muita coragem para vencer meus próprios preconceitos, para hoje poder ter orgulho daquilo que sou.
Na minha estrada encontrei tantos obstáculos que hoje me encontro quase sempre na defensiva, e como atualmente estou me relacionando com um homem que definitivamente é heterossexual, muito embora que de mente aberta digamos assim, por vezes interpreto seus ditos e atitudes com algum preconceito, e logo eu que lutei tanto contra eles…
Por isso eu denominei etse tópico de: